RADARES SALVAM VIDAS: NOVO ESTUDO EXPÕE DESIGUALDADE NA FISCALIZAÇÃO DE VELOCIDADE NO BRASIL
Relatório do ONSV e UFPR revela que o Brasil fiscaliza pouco e mal a velocidade. Estados com mais radares têm mais respeito aos limites e menos risco nas vias
A velocidade excessiva continua sendo um dos maiores fatores de risco no trânsito brasileiro — e um novo relatório técnico reforça, com dados inéditos, o tamanho do problema. Produzido pelo Observatório Nacional de Segurança Viária (ONSV) em parceria com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), o documento “Indicadores Brasileiros sobre Fiscalização de Velocidade” apresenta um diagnóstico detalhado: o Brasil fiscaliza pouco, fiscaliza mal e está longe das recomendações internacionais para salvar vidas no trânsito.
O estudo mostra que a maior parte das cidades e rodovias brasileiras mantém limites de velocidade superiores aos indicados pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Nas áreas urbanas, por exemplo, a OMS recomenda máximo de 50 km/h — algo que muitos municípios não apenas ignoram, como flexibilizam ainda mais. Para atropelamentos, o limite seguro recomendado é de 30 km/h, já adotado em cidades-modelo de segurança viária ao redor do mundo.
Apesar disso, a fiscalização eletrônica no Brasil avança de forma tímida e desproporcional entre os estados. A média nacional é de 2,09 câmeras fixas para cada 10 mil veículos, número considerado muito baixo por especialistas e totalmente desigual. O Distrito Federal, por exemplo, lidera com 7,50 câmeras — mais de 60 vezes o índice registrado no Amazonas (0,12).
Fiscalização funciona — e os dados provam
Um dos achados mais importantes do relatório confirma o que especialistas afirmam há anos: onde há mais fiscalização, há mais respeito aos limites de velocidade. A análise estatística revela uma correlação significativa entre densidade de radares e comportamento do motorista:
Em resumo: quando a percepção de fiscalização aumenta, a velocidade cai.
Cada radar brasileiro registra, em média, 1.500 infrações por ano. Mas a distribuição é desigual: enquanto no Rio Grande do Sul cada equipamento capta cerca de 700 irregularidades, no Amazonas esse número ultrapassa 4.500 — reflexo da baixíssima presença de fiscalização no estado.
Outro ponto importante: embora não haja correlação estatística direta entre número de radares e mortalidade no trânsito, o estudo encontrou um padrão inequívoco: nenhum estado altamente fiscalizado apresenta altos índices de mortalidade. Isso reafirma que a fiscalização é um componente essencial de um sistema seguro, embora não o único.
Limites mais altos que o recomendado e infraestrutura inadequada
O relatório também evidencia que o Brasil está descolado das diretrizes internacionais de segurança viária. De acordo com o Global Status Report on Road Safety 2023, da OMS, os limites brasileiros em áreas urbanas estão acima do recomendado para evitar lesões graves e mortes.
A abordagem de Sistemas Seguros aponta valores de máximo impacto tolerável para garantir a sobrevivência:
Mesmo assim, os radares brasileiros fiscalizam, em sua maioria, velocidades de 60 km/h — evidenciando uma infraestrutura que ainda privilegia a fluidez, e não a vida.
Curitiba mostra: excesso de velocidade não compensa
O relatório inclui uma síntese de seis estudos naturalísticos realizados em Curitiba, onde veículos de motoristas voluntários foram equipados com câmeras e GPS. Os resultados são reveladores e derrubam mitos populares sobre velocidade.
Entre os achados:
Essas descobertas reforçam que o comportamento do motorista é profundamente influenciado pelo ambiente. Ou seja: não basta conscientizar — é preciso redesenhar as vias e fiscalizar de forma consistente.
Uma política pública urgente e baseada em evidências
O relatório conclui que o Brasil precisa avançar urgentemente na gestão de velocidades, ampliando o uso de fiscalização eletrônica e adotando intervenções de engenharia mais eficazes. Isso inclui:
A velocidade é uma variável que define a sobrevivência em um sinistro. O país dispõe de dados sólidos, análises aprofundadas e evidências científicas. Agora, falta transformar esse conhecimento em política pública de forma consistente, contínua e em escala.
Enquanto isso não acontecer, o Brasil continuará distante das metas internacionais de redução de mortes no trânsito — e continuará perdendo vidas que poderiam ser salvas com medidas simples, baratas e comprovadamente eficazes.
Fonte: Portal do Trânsito / Foto: joasouza para Depositphotos